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Foto do escritorAlessander Raker Stehling

Vício e Dopamina: Como o Cérebro Cria Tolerância e Busca Mais Estímulos

Lembro da minha viagem à Bahia, terra onde a pimenta reina soberana — e o paladar do povo é forjado no fogo. Sentei-me todo animado para experimentar o famoso acarajé e, como sou prevenido, perguntei à simpática baiana da barraca: “Esse molho de pimenta arde?” Ela, com um sorriso tranquilo, me respondeu: “Arde nada, é fraquinha meu rei.” Ah, se arrependimento matasse… Com a primeira mordida, eu estava cuspindo fogo pelas ventas — e por outros locais também, confesso! Mas a parte engraçada dessa história nem é o meu desespero, e sim o fato de que, para ela, realmente não ardia. A pimenta virou “pimentinha” depois de anos de uso — o que seria um inferno para mim, era “palitinho de fósforo” para ela.


Essa minha experiência traz um paralelo curioso para a gente pensar: a nossa adaptação aos estímulos. No começo, uma gotinha de pimenta já nos faz correr para o copo d'água ou o que tiver para beber, mas com o tempo… Bom, vai chegando o momento em que só um balde da coisa faz efeito — e olhe lá.


Isso me lembra um fenômeno que ocorre em várias áreas da vida: no vício em apostas online, compras compulsivas, uso excessivo do celular ou nas redes sociais; onde a gente começa “devagarinho”, mas depois se pega buscando mais e mais para sentir o mesmo “barato”. Parece familiar?



O cérebro humano é uma máquina fascinante. Quando exposto a algo prazeroso, ativa seu sistema de recompensa — uma chuva de dopamina, o neurotransmissor da felicidade, nos inunda. Mas, com o tempo, o cérebro se adapta e exige mais do mesmo estímulo para liberar a mesma quantidade de dopamina. Ou seja, se ontem bastava assistir a um vídeo no Instagram para se sentir bem, hoje é preciso rolar a tela por várias horas — e amanhã talvez nem o Instagram inteiro baste!


E não estamos falando só de mídias sociais não. Pense em apostas online, compras, comida… Quantas vezes não ouvimos histórias de pessoas que começaram com uma aposta de cinco reais, só “para ver como é”, e acabaram tendo que vender a própria casa? O que começou como diversão, vira uma necessidade insaciável. A gente vai aumentando a dose, até perceber que o prazer já não é mais o mesmo — mas a compulsão, essa, continua firme e forte.


“Mas, Alessander, por que isso acontece?” Bom, basicamente, o cérebro vai desenvolvendo tolerância ao estímulo. Assim como a baiana do acarajé desenvolveu sua tolerância à pimenta, nós fazemos isso com qualquer coisa que acione o tal sistema de recompensa. Se não controlarmos, acabamos reféns do hábito, correndo atrás daquela satisfação inicial que nunca chega — igual a um viciado em pimenta, que precisa de litros para sentir o calor que antes vinha com uma gotinha.


E se engana quem pensa que esse é um problema “pequeno”. Vivemos numa sociedade viciada em tudo: do celular à comida, passando pelo trabalho excessivo — sim, até o workaholic precisa de mais trabalho para sentir o “gostinho” de realização. Para sair dessa roda-viva, é preciso, primeiro, reconhecer que há um problema. Muitas vezes, o primeiro sinal de vício é quando aquele hábito começa a nos consumir — em vez de ser o contrário.


A partir daí, o trabalho começa: cortar gradualmente, resistir às tentações e, principalmente, aprender a encontrar prazer em atividades mais saudáveis. Parece simples? Pois é, mas o nosso cérebro vai lutar contra isso — a briga vai ser boa e a batalha vai ser dura. Estratégias como terapia, exercícios físicos e mindfulness podem ser grandes aliados. É preciso treinar o cérebro para aceitar menos e, paradoxalmente, começar a valorizar mais o pouco que recebe — como dizem, é preciso aprender a saborear o que se come.


Então, da próxima vez que sentir aquela vontade irresistível de checar o celular a cada cinco minutos, de fazer mais uma aposta, ou de comprar algo de que não precisa, lembre-se: tudo começa com uma “gotinha de pimenta”, mas com o tempo, a gente acaba precisando de uma “bacia” para sentir o mesmo ardor que sentimos inicialmente — e o prazer? Ah, quando chega nesse ponto, o prazer já virou fumaça há muito tempo.


— Alessander Raker Stehling

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“Uma pessoa habituada a excessos de excitação é como uma pessoa viciada em pimenta, que acaba achando irrisória uma certa quantidade que deixaria qualquer outra pessoa cuspindo fogo.” - Frases Bertrand Russell
“Uma pessoa habituada a excessos de excitação é como uma pessoa viciada em pimenta, que acaba achando irrisória uma certa quantidade que deixaria qualquer outra pessoa cuspindo fogo.” - Frases Bertrand Russell

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