Terapia com ChatGPT Funciona? O Que Freud Diria Sobre Buscar Ajuda em IAs
- Alessander Raker Stehling
- 8 de jul.
- 3 min de leitura
“Estou apaixonado, fazendo terapia com o ChatGPT e tem me ajudado muito.”
“Eu também estou fazendo, e vou te falar: ele é melhor que muitos terapeutas por aí.”
Esses relatos têm se tornado comuns nas redes sociais. De forma direta: muita gente está trocando as terapias convencionais, o encontro humano com um profissional, por conversas com inteligências artificiais. Mas a pergunta que fica é: isso funciona? E, mais ainda — o que Freud diria sobre isso?
Freud, o pai da psicanálise, dizia que a verdadeira tarefa do trabalho terapêutico não é apenas consolar, aconselhar ou organizar ideias. É levar o paciente ao conhecimento dos seus impulsos inconscientes reprimidos. E, para isso, é preciso descobrir e dissolver as resistências psíquicas que a pessoa coloca para evitar esse contato com o desconhecido dentro de si.
Ou seja — a função do terapeuta não é só ouvir o que você diz. É captar o que você não diz. É prestar atenção no que escapa, nos lapsos, nos silêncios constrangedores, nos sentimentos de raiva, nas repetições de comportamento, no que você tenta evitar a todo custo. Porque é justamente aí que está a chave da mudança.
E, por mais avançada, cordial ou bem treinada que seja uma IA, ela não tem a experiência humana para lidar com essas nuances. Uma IA pode organizar o que você fala, devolver frases bonitas, sugerir reflexões interessantes e até te fazer sentir acolhido num momento difícil. Mas o inconsciente não está acessível por palavras organizadas e respostas previsíveis. Ele se revela no desconforto, no estranho, no contraditório, naquilo que, de tão humano, incomoda.
O encontro terapêutico real é infinitamente mais rico porque inclui não só as palavras ditas, mas os olhares evitados, os suspiros, a hesitação ao contar algo íntimo, o incômodo diante de um comentário que toca onde você não queria mexer. É o espaço onde surgem as angústias, as frustrações e os afetos contraditórios que, justamente por serem difíceis, te impulsionam a se conhecer de verdade.
Conversar com uma IA pode ser agradável, mas passa longe de ser terapia, porque dificilmente ela te levará ao desconhecido em você. E mais: dificilmente você permitirá que isso aconteça com uma máquina. Afinal, nosso inconsciente não se abre a quem não nos frustra, não nos desafia, não nos provoca. E, convenhamos — nenhuma IA está disposta a te desagradar ou tocar na sua ferida narcísica. E, se fizer, será por acaso, sem compreender a importância disso.
Freud sabia que, sem atravessar as resistências, nenhuma mudança psíquica real ocorre. E resistir é humano. Resistimos a enxergar nossos lados sombrios, nossas invejas, agressividades e desejos mais sacanas. Um terapeuta, atento e preparado, percebe esses sinais, escuta as entrelinhas, respeita os seus tempos, mas não se ilude com suas defesas. Ele sabe que o verdadeiro encontro terapêutico não é sempre agradável — mas é libertador.
Portanto, sim, as inteligências artificiais são ótimas ferramentas de apoio: podem organizar ideias, aliviar ansiedades imediatas, sugerir caminhos de reflexão. Mas substituir a terapia humana, na sua essência, é não entender o que é a terapia de fato. Porque terapia não é só conversa. É encontro. É atravessamento. É, muitas vezes, desconforto. E é justamente esse desconforto, conduzido com responsabilidade e afeto, que permite o verdadeiro autoconhecimento.
Freud provavelmente sorriria diante desses relatos modernos e diria: “O homem continua a buscar atalhos para fugir de si mesmo. Mas o caminho da verdade é sempre atravessado pelas resistências.”
E resistir a mudanças, meu amigo, é a coisa que a humanidade mais sabe fazer — tô mentindo?
— Alessander Raker Stehling
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