Rubem Alves, um mestre das reflexões, dizia que este aforismo do filósofo alemão Nietzsche era o seu preferido: “Ao iniciar um casamento, o homem deve se colocar a seguinte pergunta: você acredita que gostará de conversar com esta mulher até na velhice? Tudo o mais no casamento é transitório, mas a maior parte do tempo é dedicada à conversa.” Mas será que alguém hoje leva isso a sério?
Em tempos onde a “sociedade líquida” valoriza o instantâneo e o fugaz, essa frase pode parecer antiquada. Dá para imaginar o que alguns diriam: “Conversar? Ah, eu quero é uma mulher bonita, malhada, e se me satisfizer na cama, tô feliz!” Ou então: “Bate-papo? Me leva para as Maldivas que o resto eu resolvo depois.” Para muitos, o casamento virou um pacote cheio de imagens filtradas, como nas mídias sociais: luxo, corpos perfeitos, praias paradisíacas e sorrisos impecáveis. A ideia de Nietzsche — de que uma boa conversa deveria ser o centro da relação — parece até ridícula para essa mentalidade imediatista.
Mas se pararmos para refletir — e aqui é onde Nietzsche brilha —, a conversa é o verdadeiro alicerce de uma relação. Imagine-se convivendo com a mesma pessoa, dia após dia, por décadas. Agora pense: é possível conviver assim sem respeito? Além disso, conversar diariamente, de forma espontânea e sem ser forçado, exige uma admiração mútua e conteúdo. E não se trata apenas de concordar. Na verdade, é mais sobre discordar e, mesmo assim, querer ouvir o outro. Na verdadeira conversa, há espaço para a diferença, para o confronto de ideias, sem que isso quebre a relação.
O que Nietzsche propõe, na verdade, é o entendimento de que o casamento vai além das aparências. Beleza, dinheiro, status — tudo isso pode atrair, mas é temporário. A juventude passa, o status muda, e o dinheiro pode escorrer pelos dedos. O que fica? A capacidade de sentar ao lado dessa pessoa, talvez com algumas rugas a mais, e querer conversar. Quer entender o real sucesso de uma relação? Pergunte-se: essa pessoa te instiga? Você sente prazer em trocar ideias com ela? Você consegue rir, brigar, filosofar e, no fim, continuar apreciando a presença dela?
Nietzsche nos alerta contra a superficialidade moderna, onde as relações se constroem sobre alicerces frágeis. Hoje, nos deixamos encantar pelo brilho da superfície — pelo glamour do instante — e esquecemos que, no fim das contas, viver junto é mais sobre compartilhar uma boa conversa do que qualquer outra coisa. E aqui vai a crítica: quando se busca apenas o efêmero, quando o foco é o que vai aparecer na foto ou nas redes, a relação está fadada à brevidade.
O modelo de Nietzsche, por outro lado, nos desafia a valorizar o que realmente importa: uma conexão que transcenda o tempo, onde a conversa se torna o verdadeiro alicerce do amor. Porque, na velhice, quando o corpo já não for o mesmo e as viagens paradisíacas se tornarem apenas memórias, será o diálogo — aquelas longas conversas madrugada adentro, os risos em conjunto e até as discordâncias construtivas — que manterá a chama acesa.
Se você conquistou isso, parabéns. Esse presente é tão raro e valioso que nem a riqueza, a beleza… e nem mesmo a morte, poderão apagar.
— Alessander Raker Stehling
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