Ontem, precisei ir ao banco, e quem diria, aquela fila quilométrica me reservava uma conversa interessante. Logo na minha frente estava o Sr. Antônio, visivelmente irritado. Ele reclamava de tudo: do atendimento precário, do tempo de espera, da vida em geral.
“Isso aqui é um descaso! Já não basta a velhice nos maltratar, agora também tenho que aguentar esse pessoal incompetente”, desabafou, batendo o pé no chão.
“Realmente, Sr. Antônio, não tá fácil. Mas parece que o senhor já passou por muita coisa, hein?”, arrisquei puxar assunto, e ele logo se abriu.
“Passei, meu jovem, passei. Mas sabe o que mais me incomoda? Os filhos. Parece que a gente cria, cuida, e quando chega à minha idade, eles nem ligam. Podiam estar aqui na fila por mim… Outro dia, precisei de uma ajuda para consertar um vazamento, e nada! Ah, esse mundo está perdido. A gente envelhece e parece que vira peso para todo mundo”, continuou ele, ainda mais indignado.
Conforme ele falava, percebia algo que ia além das queixas sobre o atendimento ou os filhos. O Sr. Antônio falava sobre o mundo como se tudo estivesse contra ele. E, claro, o tempo era seu principal inimigo. Para ele, a velhice era o grande vilão da história. Tudo que não estava certo, tudo que não funcionava, ele jogava nas costas dos seus anos vividos.
Quando finalmente foi atendido, ele se foi com o mesmo ar de frustração. Fiquei um pouco mais na fila e continuei pensando. Me dei conta de algo: Antônio me contou a versão dele da história, mas qual seria a versão dos filhos? Será que ele sempre foi assim, reclamão de tudo? Ou será que a vida se tornou mais dura para ele porque nunca procurou se desenvolver, se abrir para o autoconhecimento e o autodesenvolvimento?
Cícero, há mais de dois mil anos, já sabia que muitos chegam à velhice culpando o tempo por seus fracassos. Aqueles que passam a vida sem se preocupar em desenvolver virtudes como paciência, sabedoria, temperança, acabam, na velhice, amargurados. Frustrados por não terem recursos para enfrentar os problemas da vida, por não terem relações próximas de suporte, não serem quem gostariam de ser… estes, muitas vezes, culpam a idade pelas próprias insuficiências.
Mas não é a velhice que nos traz esse peso. Cícero nos lembra que uma vida bem vivida, dedicada ao conhecimento e à busca pelas virtudes, torna a velhice não um fardo, mas uma etapa serena e até feliz. Se passamos a vida fugindo de responsabilidades, a idade só amplifica nossa insatisfação. Quem não cultivou sabedoria, coragem, ou até o simples hábito de olhar para dentro, acaba afogado nas queixas.
O Sr. Antônio, como tantos outros, talvez não tivesse se dado conta disso. Culpar a velhice é fácil; difícil é encarar que a raiz das frustrações muitas vezes está na falta de crescimento, na imaturidade que se arrastou por longos anos.
Envelhecer não é o problema. O problema é chegar à velhice sem ter aprendido nada sobre si mesmo.
— Alessander Raker Stehling
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