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Foto do escritorAlessander Raker Stehling

Psicanálise e Psicologia: Um Estudo de Caso Emocionante sobre Trauma, Resiliência e Ressignificação

Ainda me lembro do meu primeiro paciente, que, na verdade, nunca foi meu paciente — “Como assim?” Calma, sente-se aqui do meu lado, deixe-me te contar.


Eu estava em casa sozinho à noite, e meu telefone tocou: “Olá, meu nome é Bruno (o nome real foi alterado por questões de privacidade, mas a história é verdadeira). Li seus textos e gostei muito, tenho algumas dúvidas e não sei se você poderia me ajudar.” “Uai, ainda sou estudante, não atendo, mas posso tentar te ajudar. Só não prometo, pois ainda não sei muito”, respondi. Combinamos assim. Ele, cheio de dúvidas, mas apaixonado por Freud, e eu também apaixonado por Freud. Nesse ponto, estávamos de comum acordo.


Tirei algumas dúvidas básicas dele a respeito de algumas teorias e, no mais, conversávamos sobre vários assuntos: sonhos, desejos, reflexões. Senti que estávamos nos aproximando como amigos. Ele me falou sobre sua relação com seus familiares (pai bipolar e mãe negligente), seu sonho em ser enfermeiro e seus traumas (isso de forma superficial, bem superficial). Ele, morando no Nordeste, e eu em Minas, estávamos bem distantes, mas unidos pela curiosidade, humanidade e vontade de aprender.


Um belo dia, Bruno me mandou uma mensagem pelo WhatsApp dizendo que iria tirar a própria vida. Disse que jogaria seu carro no primeiro caminhão na rodovia, que estava cansado do que passava em casa e do que sofreu na infância, que a vida não tinha prazer algum. Fiquei desesperado, nunca havia passado por tal situação e nem sabia como ajudar. Imediatamente fiz uma chamada de vídeo, percebi que ele estava aflito (eu também estava, mas tentei não transparecer isso), e conversamos por uns trinta minutos. Tentei acalmá-lo e conseguimos juntos sair daquela situação.


Após esse evento quase trágico, fiquei pensando em como poderia ajudar meu amigo. Veio-me à cabeça: como infundir nele o gosto pela vida, a vontade de realizar seus sonhos, o desejo de crescer, de ajudar pessoas (já que ele queria ser enfermeiro), a curiosidade, a resiliência… eram tantas dúvidas. Eu sinceramente não sabia como ajudá-lo, me senti um fracasso, uma fraude. “Como um estudante de saúde mental não pode ajudar alguém a obter saúde mental?”


Eu não sabia o que fazer e, no desespero (eu queria muito ajudar meu amigo), fui pesquisar. Comecei a ler igual louco: Freud, Winnicott, Erich Fromm e Karen Horney. Percebi que todos eles defendiam que o trabalho do psicoterapeuta era retirar as resistências que bloqueavam o desenvolvimento natural do paciente. O próprio Winnicott (que eu conhecia muito pouco na época, mas já sentia certa conexão) defendia uma propensão inata no ser humano para o amadurecimento. Assim como uma semente de laranja tem propensão para se tornar uma laranjeira madura e produzir frutos se as condições para seu amadurecimento forem satisfeitas, o ser humano também iria amadurecer se os obstáculos para seu crescimento fossem eliminados.


Aquelas palavras de Winnicott foram para mim como um oásis em meio ao deserto. Eu não precisaria tentar convencer meu amigo de que a vida valia a pena, que ele amava cuidar dos outros, que tinha um futuro brilhante, nada disso — eu também não saberia como fazer isso. Tudo que eu teria que fazer era remover os obstáculos internos dele e todas as capacidades humanas inatas iriam aflorar. Creio que você, que está lendo, consegue imaginar quão animado e esperançoso fiquei.


Nunca fizemos terapia. Até tentamos uma vez por vídeo, mas ambos ficamos calados. Senti que ele tinha muitas resistências para se abrir, mas nunca o forcei a isso. Conversávamos pelo WhatsApp mesmo, por mensagem de voz ou texto, e nisso fui aos poucos apresentando o que eu estava aprendendo e ele se abrindo. Percebi que o maior obstáculo dele era acreditar que deveria cuidar do seu pai por toda vida (que tinha muitas limitações psicológicas e comportamentos infantis). Nisso, ele se privava de viver a própria vida. Ele não acreditava em seu potencial, mas eu sim, nunca duvidei da capacidade dele.


Fomos lentamente trabalhando essa e outras resistências. Eu sentia a humanidade latente em seu interior e o enorme potencial que ele tinha. Aos poucos, Bruno foi se arriscando mais, até decidir fazer vestibular. Meus olhos encheram-se de lágrimas quando ele disse que havia passado no curso de enfermagem e inclusive me agradeceu muito pela conquista. Falei que era mérito dele, que tudo aquilo já estava em seu interior.


O Bruno continua firme em direção aos seus sonhos, tenho muito orgulho dele. Ele brinca que foi meu primeiro paciente, eu morro de rir disso, porque, na verdade, nunca fizemos uma sessão de terapia — seguindo os moldes que caracterizam uma terapia. Sei que ele tem profunda gratidão pelo que fiz, mas eu também sou enormemente grato a ele. Com o meu amigo (nunca paciente) aprendi a importância da empatia, da conexão humana, de escutar atentamente, e de acreditar no potencial humano. Também pude confirmar, através desse amigo, a teoria de Winnicott: de que existe uma tendência inata ao amadurecimento no ser humano e que tudo que precisamos fazer é retirar os obstáculos para que ela se concretize.


O Bruno me mostrou que, às vezes, o simples fato de estarmos presentes na vida de alguém pode ser o suporte necessário para que a pessoa encontre a própria força e caminho. Foi uma experiência que, embora não planejada, me moldou como futuro profissional e, acima de tudo, como ser humano.


Muito obrigado, querido amigo, te desejo todo sucesso do mundo.


— Alessander Raker Stehling

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Meu Primeiro Paciente - Estudo de caso de Alessander Raker Stehling
Meu Primeiro Paciente - Estudo de caso de Alessander Raker Stehling

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