Já dizia o mestre Ariano Suassuna: “Eu tenho um fascínio enorme por louco. Eu não sei se é por identificação, mas eu me dou muito bem com doido”. E eu confesso que, entre uma risada e outra, percebo que ele estava mais lúcido do que parece. Afinal, quem é realmente “normal”? A gente vive repetindo que “… de louco todo mundo tem um pouco”, e o próprio Suassuna nem se preocupava em esconder o seu lado mais “insano” — e eu? Eu admiro essa “loucura” dele.
Agora, pensa comigo — você já parou para tentar entender as loucuras que existem em você? Não estou falando de transtornos mentais, aqueles que os psiquiatras adoram, mas da loucura mais sutil, que molda quem somos: as visões de mundo que mudam, as manias inexplicáveis, os gostos peculiares, os fetiches. Somos um caldeirão de contradições, temperado por uma combinação única de personalidade, biologia, temperamento, ambiente e experiências. Só isso já é um prato cheio para confusões internas.
E o mais curioso é que a gente vive mudando. Você lembra da versão de si mesmo de cinco anos atrás? Provavelmente não, porque você já foi tantas versões de você — e amanhã será outra ainda. Nossa personalidade é como uma cebola (não me entenda mal — cebolas são cheias de camadas e fazem a gente chorar, e a nossa personalidade também é cheia de camadas e nos faz chorar, especialmente quando tentamos entendê-la de verdade). Não somos estáveis como gostamos de acreditar. Nossas opiniões variam dependendo do humor do dia, da temperatura ou até do que comemos no almoço. Hoje você está convicto de algo, amanhã já não tem tanta certeza — e isso não te torna menos você. Apenas mostra que somos — desculpa o clichê — uma obra em constante construção, um rascunho que nunca chega a ser finalizado.
E se nós, com toda essa bagunça interna, ainda tentamos nos levar a sério… tem algo muito errado aí, não acha? Por que raios exigimos tanto dos outros, se nós mesmos não conseguimos nos entender? Exigimos clareza e coerência das pessoas ao nosso redor, especialmente em relacionamentos, mas a verdade é que mal conseguimos lidar com nossas próprias incongruências. Queremos que o outro seja previsível, estável, uma rocha… enquanto nós somos mais parecidos com slime — alguém ainda brinca com isso?!
A gente se coloca num pedestal, como se fosse um ser inabalável, inflexível, imutável — e isso só torna tudo mais ridículo. Quantas vezes nos pegamos pensando: “Por que fulano não me entende?” ou “Como é que ciclano não vê o mundo como eu vejo?” — quando, no fundo, nem nós nos entendemos por completo! Quem somos nós para exigir que o outro seja perfeito, previsível e coerente? Talvez, se conseguíssemos ver o quanto somos mutáveis, confusos e “loucos”, poderíamos nos dar ao luxo de relaxar, rir de nós mesmos e, quem sabe, ser um pouquinho mais compreensivos.
Então, por que não abraçar um pouco a nossa própria “loucura” e aceitar que, no fundo, ninguém está no controle? Assim, quem sabe, a vida — e os outros — fiquem um pouco mais fáceis de conviver. E, no fim das contas, talvez seja isso que o Suassuna quis dizer quando falou de se dar bem com os “doidos”. Ele simplesmente entendeu que, no final do dia, somos todos loucos tentando nos equilibrar em um mundo de gente tão perdida quanto nós.
— Alessander Raker Stehling
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